quinta-feira, 29 de março de 2012

O adeus ao mestre do riso

Prezado Chico Almir, envio a crônica "O adeus ao mestre do riso", em homenagem ao grande Chico Anysio. Mesmo sabendo que a mídia já relembrou por todas as formas as criações maravilhosas do grande mestre, tomei a iniciativa de fazê-lo também, à minha maneira. Foi o jeito que encontrei para criticar por tabela alguns programas de qualidade duvidosa que são veiculados na TV brasileira atualmente. Se considerar o texto interessante para publicação, agradeço, como sempre.

Abraços, do amigo José Luiz Boromelo

"A cultura brasileira perdeu mais um de seus legítimos representantes. Foi-se embora, aos 80 anos, o inesquecível Chico Anysio, humorista, ator, escritor, compositor e criador de centenas de personagens que fizeram a história da tevê no País. Artista completo, crítico refinado, que incorporava com sutileza e perfeição suas criações.

Detentor de uma inteligência privilegiada costumava mostrar toda sua competência utilizando-se apenas de um microfone, uma plateia e um palco, local onde se mostrava totalmente à vontade para fazer o que mais gostava: o humor sadio, irreverente e perspicaz, fazendo do espectador um coadjuvante voluntário, transformando o colóquio improvisado numa perfeita interação entre apresentador e público.

Chico acertava em cheio a cada novo personagem que encarnava. Assim foi com Alberto Roberto, Bento Carneiro, Pantaleão, Gastão, Justo Veríssimo, Salomé, Painho, Professor Raimundo e tantos outros. Acabou influenciando toda uma geração, criando um estilo próprio, copiado e reproduzido por muitos outros humoristas, tornando-se referência na arte de entreter o público.

Os diálogos consistentes e estruturados, baseados em acontecimentos da política, economia, comportamento e no dia a dia do cidadão comum fizeram suas criações tomarem vida própria, muitas vezes tornando impossível distinguir o real do imaginário. As falas bem pontuadas e as interjeições carregadas com sotaques regionalistas que caracterizavam os personagens permitiam ao espectador uma perfeita reciprocidade, angariando cada vez mais a simpatia dos apreciadores da arte do humor.

Infelizmente, a maioria dos programas humorísticos da atualidade destoa completamente daqueles protagonizados pelo velho Chico. Tem-se a percepção de que alguns profissionais da área perderam as referências do grande mestre.

O que se observa são simulacros de esquetes medíocres em busca de reconhecimento, em que temos a nítida impressão de uma generalizada e deliberada algazarra, fazendo do controle remoto um fiel aliado, seja para mudar de canal ou amenizar a gritaria protagonizada pelos pretensos candidatos a humoristas.

Difícil é classificá-los como tal, uma vez que a maioria se encarrega naturalmente de desfazer essa possibilidade imediatamente, deixando a sensação de que as caretas e os trejeitos exagerados seriam mais bem aproveitados no ambiente circense.

Os exemplos dessa tendência estão presentes na programação televisiva, que procura por todas as formas influenciar modismos, com resultados pífios e momentâneos. Até os profissionais mais experientes renderam-se aos novos tempos. Foi-se a época dos textos ingênuos, despretensiosos. O humor passou a ser produzido como que pasteurizado, em que a malícia e os diálogos de duplo sentido ganharam relevância e tornaram-se o carro-chefe dos programas intitulados humorísticos.

É desalentador constatar que um grande humorista brasileiro, consagrado entre adultos e crianças e que no passado fazia parte de um quarteto admirado, responsável por momentos inesquecíveis, hoje se restrinja a transformar seus parceiros de cena em simples coadjuvantes, sem relevância alguma e em condição de subserviência total a um "script" perverso e de conteúdo frívolo, nem de longe comparado aos roteiros bem elaborados de outrora.

Felizmente, fica para a posteridade o legado em forma de um riquíssimo acervo da obra de Francisco Anysio de Oliveira Paula Filho, imortalizado em seus mais de 60 anos de carreira, em que procurou mostrar com extrema simplicidade, assim como tudo em sua vida, que a arte de fazer rir é para poucos.

Hoje, com certeza estamos um pouco mais tristes. Mas não menos esperançosos, uma vez que fez questão de plantar boas sementes, que certamente germinarão em solo fértil. Obrigado professor Raimundo, por nos oferecer por décadas a sua competência, a alegria e o bom humor, e nos mostrar com tamanha sensibilidade as cores da miscigenação étnica presente em nosso povo. O seu exemplo estará nas lembranças de cada brasileiro, tão bem representados por seus aplicados alunos."

José Luiz Boromelo
Policial rodoviário aposentado da
reserva e cronista, em Marialva-Paraná

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