Eis artigo da diretora da sucursal da revista Època no Rio de Janeiro jornalista Ruth de Aquino sobre as vergonhosas aposentadorias concedidas a ex-governadores
Causam asco as aposentadorias inconstitucionais, milionárias e vitalícias de ex-governadores e seus herdeiros. Esses benefícios são um roubo e desmoralizam a profissão de político. Em toda a sua vida ativa, o cidadão comum e assalariado é chamado de “contribuinte”. O nome é correto. Contribuímos ao pagar impostos. No Brasil, infelizmente, os impostos são escorchantes e não servem para seu fim mais nobre.
Em  países civilizados, essa contribuição tem um sentido público claro.  Medicina e educação costumam ter qualidade e ser gratuitas. Quantos de  nós pagaríamos impostos com mais alegria se o dinheiro descontado  mensalmente do salário financiasse serviços para os mais carentes e a  classe média. 
A aposentadoria máxima é de R$ 3.200 por  mês para quem trabalha 35 anos. Mas os ex-governadores estão acima das  regras. Mesmo que governem um Estado por apenas alguns dias, podem  ganhar aposentadoria de R$ 10 mil a R$ 24 mil. Para sempre, até morrer.  E, após a morte, as viúvas assumem integralmente o benefício. 
O  Supremo Tribunal Federal, em 2007, considerou inconstitucional a  aposentadoria de Zeca do PT, ex-governador de Mato Grosso do Sul. Mas o  STF é mais lento quando a ação se destina a derrubar a mesma lei no  Maranhão. Essa ação “está tramitando” no Supremo. O alvo é o clã Sarney:  José e a filha Roseana ganham pensão vitalícia de R$ 24 mil. São tantos  os penduricalhos na conta do magnata da política José Sarney que,  durante um ano, ele não percebeu que depositaram irregularmente o  auxílio-moradia de R$ 3.800. Foram R$ 45 mil de “equívoco”, que depois  ele afirma ter devolvido. 
O senador, ex-presidente e  ex-governador do Maranhão ganha subsídio de R$ 26 mil, verba para  passagens, casa, gasolina, e ainda por cima uma pensão eterna. Como  descobrir aquilo a que não tem direito? Sarney tem direito a tudo, mesmo  que seu Maranhão tenha indicadores sociais lamentáveis. Como disse o  ex-presidente Lula, Sarney “não pode ser julgado como um homem comum”. 
A  OAB entrou no Supremo, na sexta-feira, com ações de  inconstitucionalidade contra as aposentadorias de ex-governadores de  dois Estados: Sergipe e Paraná. As pensões são descritas como “grave  ofensa ao princípio republicano”. 
O  Paraná é um caso especial e curioso de hipocrisia. Não contente com os  R$ 18 mil mensais que recebeu de pensão nos últimos meses, o senador  tucano Álvaro Dias pediu à Justiça mais de R$ 1,5 milhão de benefícios  retroativos pelo período em que governou o Paraná, de 1987 a 1991.  Depois de flagrado, disse que a dinheirama seria para doar a uma  instituição assistencial que mantém uma creche em Curitiba. “Centavo por  centavo”, diz ele. Você acredita? 
Digamos que sim. Que  Álvaro Dias seja um senador beneficente, em busca de uma vaga no reino  dos céus. Mas o senador por acaso sabe que caridade se faz com o próprio  dinheiro, e não com o dinheiro de seus eleitores? Eles podem preferir  doar para cegos, órfãos, idosos. Ou simplesmente não doar o que não têm,  porque ainda sonham com impostos menores e mais justos no Brasil. Como  disse o presidente da OAB, Ophir Cavalcante, “queremos estancar essa  sangria com dinheiro público”. 
É estranho que uma  imoralidade como essa seja praticada em vários Estados há anos, sem que  ninguém se rebele. Ninguém sabia de nada? Fala-se tanto de rombo na  Previdência. Nós pagamos mais de R$ 30 milhões por ano de pensões para  ex-governadores de todos os partidos. São os mesmos políticos que, no  Senado, querem a volta da CPMF porque a saúde está em frangalhos. 
Por  que o STF não cria uma regra para todo o país? Regrinha básica:  “Ex-governadores não podem violar a Constituição nem meter a mão no  bolso dos outros”. Dá para entender? 

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